27.12.06

Pare o que você está fazendo

E vá ouvir alguma coisa do músico etíope Mulatu Astatke.

25.12.06

Classificados

Busco sabedoria.

24.12.06

Prosseguimento - 2

Não o viajar,
mas interromper o fluxo das coisas (minhas coisas).

Tenho muito o que fazer.
O toca-discos, recém instalado
O violão que quer ser decifrado
As canções que me encantam
Os livros que releio
O juriti que descobri existir
O brejo da cruz
O trem
O choro de Osvaldo Lacerda
Melquíades
Os deliciosos e variados sucos
O dominó
As rabiscagens
Os tambores de Minas
O Anhangabaú (ambos)
e

23.12.06

Prosseguimento - 1

...
Este ano, a vontade não é viajar.
É sustentar.

Nem espero quebrar o quer que seja: lembranças, sonhos, o tempo.

É prosseguir.
...

22.12.06

Pólvora e poesia

Quanta beleza existe nos panos esvoaçantes de um filme chinês de artes marciais... quanta beleza nas sombras do labirinto de um fauno, quanta beleza pode haver em dois amantes mendigos errando pelo Japão atados por uma corda? Quanta beleza há nas palavras rabugentas que se recusam a cantar em uma poesia? Quanta beleza nas palavras do amante que ficou vivo, quanta beleza nas entrelinhas de uma tragédia grega. Quanta beleza num simples gesto de mão, quanta beleza num ritmo corporal dilatado, quanta beleza no olhar nos olhos... quanta beleza numa pincelada abstrata, quanta beleza numa lâmpada que se acende, quanta beleza na areia mais branca das areias. Quanta beleza na explosão de um barco que leva uma mãe e sua pequena filha, num nariz sendo esmagado por golpes de uma garrafa, quanta beleza no dedo de um jovem rapaz holandês sendo cortado por uma terrorista árabe. Quanta beleza na tortura de crianças inocentes, no estupro silencioso da dama, no rapaz espancado chorando na soleira da porta. Quanta beleza, não é?, num saco plástico voando com o vento. No enforcamento da heroína indefesa. Na cegueira do mestre ilustrador. Na masturbação masoquista de Mishima. Na desconstrução de Hamlet. A beleza na pintura de um frango. Na fotografia de um prédio branco. No lábio leporino de Michael K. No canto desafinado de severinas, dizendo que a hora é hora. Quanta beleza na demonstração matemática do adultério de Penélope? Nas perversões rodriguianas e almodovarianas e pasolinianas. No gaguejar de Woody Allen e suas trilhas sonoras saídas de uma vitrola. Nas sobrancelhas unidas da pintora, Quanta beleza na figura andrógina de Nijinski. Quanta beleza na dor da mulher cúbica que chora sobre a mesa (lembro até de sua posição na exposição...)? Quanta beleza num prédio geométrico e orgânico. Quanta beleza na introdução melódica de uma canção do Chico. Quanta beleza na voz desafinada de uma cantora tradicional japonesa. No pacto com o demônio contado por Guimarães Rosa. Na máquina voadora do padre! Na trilha sonora de um filme com uma bela trilha sonora. Numa descida em prosa poética ao inferno. Num futuro bizarro e cômico em que alguém pode chamar-se Sayonara, Gangsters. No conto infantil de uma flor gigantesca e o menino que se acaba para regá-la.
A arte é bela (ou Thelma & Louise).

21.12.06

Tem também aquela história do homem que encontrou Jesus e foi assegurado pelo Senhor que este sempre o acompanharia em sua vida, e a partir desse dia sempre que ao final da tarde o homem olhava para trás via que o caminho que percorrera pela areia estava marcado por dois pares de pegadas e não só um como seria de se esperar, mas quando um pouco depois o homem passou por tempos difíceis de vergonha e medo, miséria e solidão, voltou a encontrar apenas um par de pegadas em sua trilha, e perguntando a Jesus "como pudestes abandonar-me nos meus tempos de maior necessidade" ouviu a resposta "não te abandonei, havia só uma pegada porque por sua dificuldade eu estava te carregando". Acho que a religião é que nem o amor (não que eu precisasse contar toda a história para chegar a essa conclusão).

17.12.06

Problema público

Como diminuir a poluição luminosa da cidade sem corrermos o risco de ver aumentados violência, acidentes de trânsito, tráfico?

Ou então o fundamental: como enxergar mais estrelas?

15.12.06

- Você ouviu alguma coisa?
- Não, nada.
- Você nunca ouve nada.
- E você, ouviu alguma coisa?
- Não, mas tenho a impressão de ouvir alguma coisa?
- Você ouviu ou não ouviu?
- Eu não ouvi com as orelhas, mas imaginei ter ouvido alguma coisa.
- Imaginou? Sem as orelhas?
- Você, você nunca imagina nada, é por isso que você nunca ouve nada e nem vê nada.

* * *

Era para ser dia, mas faz... escuro. Adianta se expor no escuro?

* * *

Já que não há outra injustiça sobre essa terra
a não ser a própria injustiça da terra
que é estéril pelo quente
e estéril pelo frio
e raramente fértil pela doce mistura do quente e do frio,
não há injustiça entre dois seres que caminham sobre a mesma porção de terra
submetidos aos mesmos quentes e aos mesmos frios
ou à mesma doce mistura,
e todo homem ou animal que consegue olhar outro homem ou animal nos olhos
é seu igual.

* * *

Se eu pudesse deixar-te sem te perder.

* * *

- Andei a tua procura pelo mundo todo.
- Me conheces?
- Minha vida inteira.
- Me conheces?
- Sigo-te.
- Que queres?
- Nada peço.
- Por quê?
- Porque já te amo.
- Mas não me conheces.
- Por isso. E porque pode chover a qualquer momento.
- Mas não me conheces.
- Porque já te amo.
- Por quê?
- Nada peço.
- Que queres?
- Sigo-te.
- Me conheces?
- Minha vida inteira.
- Pode chover a qualquer momento.

13.12.06

Neste, eu me apresento e me declaro inapto a nomear um meu amor (talvez um apelo)

Sou um homem
que sonha,
tem 1,80 m
e 65 Kg
(E sente-se em consonância
com a intimidade das coisas.)
Mas que adquire outras dimensões - quaisquer -
porque, à medida que o sonho se constrói,
esparrama lucidez.

Um homem que crê
na possibilidade do amor,
e desfia essa crença
com alguma angústia de ver
no emaranhado de fios
que não saberia definir
(e nem poderia)
a quem ama,
a quem ou a quê.

10.12.06

Decisão

Nada de Concerto em Ré menor de Bach!
Nada de Marchenbilder de Schumann!

Eu vou é de Meditação de Thaís, do Massenet, esbanjando quinta posição e terceiro harmônico na corda lá. E ninguém me segura.
Se é só pra ver, vou avacalhar.
E ninguém me segura!
A Companheira - Luiz Tatit

Eu ia saindo
Ela estava ali
No portão da frente
Ia até o bar
Ela quis ir junto
Tudo bem, eu disse
Ela ficou supercontente
Falava bastante
O que não faltava era assunto
Sempre ao meu lado
Não se afastava um segundo
Uma companheira
Que ia fundo
Onde eu ia
Ela ia
Onde eu olhava
Ela estava
Quando eu ria
Ela ria
Não falhava
No dia seguinte
Ela estava ali
No portão da frente
Ia trabalhar
Ela quis ir junto
Avisei que lá
O pessoal era muito exigente
Ela nem se abalou
"O que eu não soubereu pergunto"
E lançou na hora
Mais um argumento profundo
Iria comigo até o fim do mundo
Me esperava
No portão
Me encontrava
Dava a mão
Me chateava
Sim ou não?
Não.
De repente a vida ganhou sentido
Companheira assim nunca tinha tido
O que pinta sempre é uma coisa estranha
É companheira que não acompanha
Isso pra mim é felicidade
Achar alguém assim na cidade
Como uma letra para a melodia
Fica do lado faz companhia
Pensava nisso
Quando ela ali
No portão da frente
Me viu pensando
Quis pensar junto
Pensar é um ato tão
Particular do indivíduo
E ela, na hora:
"Particular, é? duvido."
E como de fato
Eu não tinha lá muita certeza
Entrei na dela
Senti firmeza
Eu pensava
Até um ponto
Ela entrava
Sem confronto
Eu fazia
O contraponto
E pronto.
Pensar assim virou uma arte
Uma canção feita em parceria
Primeira parte segunda parte
Volta o refrão e acabou a teoria
Pensamos muito por toda a tarde
Eu começava ela prosseguia
Chegamos mesmo modéstia à parte
A uma pequena filosofia
Foi nessa noite
Que bem ali
No portão da frente
Eu fiquei triste
Ela ficou junto
E a melancolia foi
Tomando conta da gente
Desintegrados
Éramos nada em conjunto
Quem nos olhava só via
Dois vagabundos
Andando assim meio
Moribundos
Eu tombava
Numa esquina
Ela caía
Por cima
Um coitado
E uma dama
Dois na lama
Mas durou pouco
Foi só uma noite
E felizmente
Eu sarei logo
Ela sarou junto
E a euforia
Bateu em cheio na gente
Sentíamos ter toda
A felicidade do mundo
Olhava a cidade
E achava a coisa mais linda
E ela achava
Mais linda ainda
Eu fazia uma poesia
Ela lia e declamava
Qualquer coisa que eu escrevia
Ela amava
Isso também durou só um dia
Chegou a noite acabou a alegria
Voltou a fria realidade
Aquela coisa bem na metade
Nunca a metade foi tão inteira
Uma medida que se supera
Metade ela era a companheira
Outra metade era eu que era

1.12.06

Arte é um saco. Alguém sugere uma profissão mais fácil (e saudável)?