24.4.05

Diálogo curto (s)

Oi.
olá.
fazendo?
sei lá!
falou.
que é?
nada... é. nada...
fala.
não. não é nada.
fala, pô.
nada, sério.
Bah!
...
que é??
calma, não é nada. Não sei de onde tirei essa idéia.
que idéia, pô?
nada. você não concordaria.
com o quê??
...
com o quê????
ahn... nada.
... Vai à merda.
...
...
Você vem sempre aqui?
venho.
...
[tosse.]
oi?
falei nada.
mas eu achei...
nada.
...
...
Você não tem nada pra falar?
Com você?
...
o que você quer?
...
fala, pombas!
...
humpf...
...
...
tá. eu falo.
Ora! Por favor.
mas é que não sei...
Vem cá: não enche o saco.
... desculpa.
...
... desculpa.
... tá!
...
...
...
... vem cá: o que você ia me falar aquela hora?
Você quer mesmo saber?
Quero, pô! Fala logo.
É que eu tive uma idéia.
Explicite-a.
Lembra daquele dia?
Qual?
O da árvore.
Sei, que é que tem?
Vamos fazer de novo?
Vamos.
Legal!
...
Quando?
Sei lá, pô. Quando der.
E a Lu?
que que tem a Lu?
E a lu?
sei lá. O que você quer?
Acho que a gente não precisa chamar ela, né?
Você que sabe...
E o Minhoca?
O Minhoca sim, né?
Não sei...
Pô! qual o seu problema com o Minhoca?
Não. se você quer a gente chama ele.
...


******


Senhor, diga-me algo sábio.
Não.



******

São três moedas.
Três moedas??
Mas da última vez que eu vim eram só duas!
Agora são três.
Mas eu só tenho duas moedas.
Como só duas?
é.
Vocâ já comeu, tem que me pagar três.
Mas eu não tenho três. Só tenho duas.
Mas tem que me pagar três.
E agora?
Você tem que me pagar três.
Mas eu não tenho três, o que você quer que eu faça?
Não sei. Eu tenho que receber três.
Posso te trazer a outra moeda mês que vem?
Daqui a um mês??
É que eu não tenho mais moedas.
Arranja. Eu tenho que receber três moedas.
Mas eu só tenho duas.
Posso te pagar depois?
E como eu vou saber que você vai me pagar?
Olha pra mim! Eu não vou te dar o calote.
Eu quero três moedas.
Pois eu não tenho três moedas!
Pede para o seu pai.
Não posso...
Então dá um jeito. Olha aqui, moleque, eu não tenho tempo.
Eu te trago amanhã a outra moeda!
E como eu sei que você vai trazer?
Você não sabe.
Deixa de brincadeira, moleque!
Eu não tenho três moedas....
Deixa de escândalo. Não é nada, gente! Moleque, pára de chorar.
Me desculpa, senhor, eu não sabia que agora eram três moedas...
Olha, vamos fazer o seguinte. Você me dá duas moedas agora e paga a terceira depois.
Posso?
Pode. Isso. Assim está melhor. Mas você vai ter que me dar esse seu boneco como caução.
Que?
Me dá o boneco. Eu te devolvo quando você me der a outra moeda.
Chato!! Então toma as três agora! Chato! Chato!


******

É?
É...
Uh!


****

20.4.05

Além do Fim

"
1. Beleza

O que acontece depois do fim? Não há mais ruas para atravessar. Nenhuma flor morta cainda em poças d'água, Não há bandeirinhas de Volpi. E toda a luz do Universo não é NADA MAIS que ondas elétricas. A única arte é o impressionismo, e o impressionismo é a física. A Física é a arte depois do fim. E nas Bienais da vida expomos fórmulas e leis. Doe suas calculadoras para um artista da Bienal.

...
2. Peste

Depois do fim não há cheiro de lixo. Depois do fim não há leishmaniose. E não há a dor do sexo. E toda a água agora é bruma. E a bruma cria mundos pré-socráticos. Tales é Deus, de certa forma.

...
3. Política

— Veja, Tomé, seu pássaro foi-se embora.
— Não, Senhor, ele está aqui: sou eu.

4. Amor








~~//~~"

Artur Sartori Kon @ Bloquinho, dez/2004

2.4.05

Fim

Afinal, por que eu continuo escrevendo aqui? De que me adianta? Muda realmente alguma coisa? Desabafar não é mais suficiente, desabafar não é nada, principalmente se feito assim, na frente de uma máquina fria e burra. Então pra que continuar?

Já postei nesse blog vinte e seis textos (sem contar este), o que deve dar umas cem páginas de reclamações, gritos, uivos, poemas, choros, maldições, palavrões etc. Mas posso ir ler o primeiro dos meus posts (pelo menos dos que importam):

- grito -
Por que eu grito?
- grito -
Risada.


Você sabe qual é a única coisa que um ser humano quer fazer? É a única coisa que ele pode conseguir. A gente só sabe gritar. Porque olha: ! Os prédios, as paredes, tudo tá em silêncio, tudo que o homem faz e é fica em silêncio, e o que não é do homem não sabe nem pode gritar, opaco pra si. - sirene de ambulância, buzina de carro, canto de pneus, toda essa merda - Ouve o silêncio, o homem se nadifica, o homem só pode gritar e fica em silêncio, que porra é essa? Por que eu grito? O grito acaba em alguns segundos, talvez ainda haja um eco, mas tudo volta ao silêncio das buzinas sirenes cantos -.

E que mudou desde então? Isso foi no dia dezesseis de julho de dois mil e quatro. Oito meses e meio atrás. Não devia ter mudado alguma coisa? Não devia ter acontecido algo?

Nada.



Então de que adiantou tudo isso? Todo o tempo gasto à frente do computador? O esforço para encontrar a palavra certa, a palavra verdadeira, a palavra bela? Como é que, mesmo depois de eu escrever

(01) Eu sou infeliz.
(02) Eu sou infeliz há algum tempo.
(03) Eu nunca fui feliz.
(04) Eu estou cada dia pior.
(05) Eu não sei por quê.
(06) Eu tenho pistas do por quê, mas elas não me satisfazem.
(07) Eu sou solitário.
(08) Eu não sinto que amo ninguém.
(...)
(12) Nos últimos anos, aprendi a me odiar.

(13) Tenho também um ódio generalizado pela humanidade.
(14) Eu não tenho condições de oferecer nada a vocês.
(15) Eu penso diariamente em me matar.
(...)
(27) Eu não sei por que minha vida não dá certo.
(...)
(36) Eu quase não tenho esperanças de uma vida melhor.
(...)
(39) Minha vida é um inferno.

(40) Minha vida é o Inferno.
(41) Não sei quem sou.
(42) Não sei o que fazer.
(43) Não acho que exista qualquer coisa que um de vocês possa fazer por mim.
(44) Não acho que exista qualquer coisa que eu possa fazer por mim.
(...)
(45) Cada dia é mais difícil.

(46) A cada dia tenho menos alegrias.
(47) A cada dia me satisfazem menos a literatura, o teatro, a filosofia, a arte, as amizades.
(48) A cada dia tenho de fingir mais.
(49) A cada dia sou menos.
(50) A cada dia morro um pouquinho.
(...)
(53) Estou cansado de existir.


, nada mudou?

E eu fico me dizendo que eu tenho de fazer algo, que não posso esperar que algo ou alguém venha me salvar. Mas PUTAMERDA falar isso É fazer alguma coisa. É fazer tudo que dá pra fazer! E nada mudou. Não é culpa minha, caralho, minha infelicidade já não é culpa minha, eu não tenho controle da situação.

Algum dia nesse blog eu escrevi “que não fazia o que tinha que fazer porque se eu fizesse isso e não desse certo eu ficaria sem saída”. Pois bem, eu fiz. E aconteceu isso mesmo.

E que saída pode haver para alguém que ouvindo belas músicas num local maravilhoso só consegue pensar em possíveis locais de onde pular para garantir a morte? Que saída pode haver para uma pessoa que não quer jogar um papelinho escrito na fogueira, mas a si próprio?

Que saída, afinal, a não ser o suicídio?

Creio que o homem não consegue viver parado. Isso seria, no mínimo, um paradoxo. O homem se define pela ação.
Não tenho mais ações possíveis.
Só me resta uma coisa.
A partir de hoje, me suicido. Não sei como se dará, não sei se será aos poucos, torturantemente, ou se será de uma vez, talvez agora mesmo, pulando por esta janela, e eu nem chegue a publicar este post. Ou então logo após fazê-lo. Quem sabe depois de amanhã, no horário do recreio, eu não esfaqueie meu coração no meio do pátio, pra todos verem?

De qualquer jeito, não faz sentido esse blog que em nada me ajuda.


Não direi que não houve reação a meu famigerado post EuSouInfeliz. Mas assim é até pior. Porque se me ligaram, se comentaram meu post, se fizeram outros posts por causa dele, se falaram comigo, se se preocuparam, por que continua tudo a mesma bosta?


Foda-se ‘quando o tempo for propício’. Não posso mais esperar, depois de anos e anos nessa mesma situação – essa de Eu sou infeliz Eu sou infeliz há algum tempo Eu nunca fui feliz Eu estou cada dia pior Eu não sei por quê Eu tenho pistas do por quê, mas elas não me satisfazem Eu sou solitário Eu não sinto que amo ninguém. Vocês não têm o direito de pedir que eu espere mais um dia sequer depois de tudo que eu já passei. Vocês não têm idéia. Nenhum de vocês tem idéia do que é ser eu. Vocês todos vivem num paraíso se for comparar à minha vida – e não digam que eu não posso saber disso, eu sei sim. Eu não conheço a fundo as situações de vocês, mas vocês têm tudo aquilo que eu não tenho e acho que nunca terei. Vocês são heróis. Vocês têm o direito de se construir ao longo de minha vida. Eu me desconstruo, me destruo, pois é isso que significa o suicídio gradual de que eu falava. Eu vou sumindo, para que – quando eu for finalmente me matar oficialmente – eu já esteja praticamente esquecido por vocês. Claro que não o suficiente para que vocês não sofram. Mas nada é perfeito, nem mesmo o nada.



Ah!, e eu, ridículo, choro: enquanto escrevo, rolam pela minha cara as lágrimas ridículas. Mesmo que ninguém esteja aqui para me ver chorar e me abraçar e dizer que sempre estará aqui por mim. Foda-se sempre estar aqui por mim, não me adianta nada, infelizmente. É gostoso o abraço, mas de nada me serve você me dizer “pro que você precisar, eu estarei aqui”, se não sei o que preciso, ou se já não existo o suficiente para precisar de nada. Se nada sei querer.

Afinal, pra quê? É só isso que eu pergunto. Ganhei o direito de perguntar isso depois de quarenta e cinco meses de sangue e lágrima e dor e dor e dor. Ganhei o direito de fazer algo, então o fiz, e me fodi. Agora morro, sem um beijo.


Sim, eu curti. Curti o acampamento, o colegial, as férias, as aulas, as festas. Mas de que me serve isso, se sou infeliz? Curti, sim, tive prazer, mas os momentos de sofrimento sempre foram em maior quantidade e intensidade. E eu não sei por quê.

Então eu olho para o nada e penso na merda que é a vida.

E vem você me perguntar se eu estou bem. Não vou aqui fazer a velha reclamação clichê de “não posso falar que não”. Você sabe que não e mesmo assim pergunta. E eu respondo que sim, e você se satisfaz. Que merda é essa? Achei um dia que você fosse igual a mim, mas hoje você ascendeu ao plano dos felizes, e nem se lembra mais do que é ser eu. Você, sim, já foi eu, mas hoje não é mais, então age só para satisfazer sua culpa e sua pseudopreocupação.

Vocês são todos assim, mesmo não tendo sido eu como ela foi.


Então nada muda. E eu fico aqui. Sozinho, é claro, sombrio, é claro, sofrendo, é claro.



Chega. Declaro o fim de minha vida. O fim dessa carne, o fim desses sentimentos, o fim desses pensamentos, o fim desses gostos, o fim dessas habilidades, o fim dessas ações, o fim desses trejeitos, o fim dessas falhas, o fim dessas qualidades, o fim dessa voz, o fim desse sangue, o fim desses impulsos, o fim dessas memórias, o fim dessas amizades, o fim desses sofrimentos, o fim desses prazeres, o fim desses olhares, o fim desses instintos, o fim desses hormônios, o fim desses movimentos, o fim dessas criações, o fim dessa liberdade. Morro. Não acontecerá imediatamente, como eu gostaria, mas por fim sobrevirá. Anuncio para quem quiser ouvir que Artur já não é mais, a partir de agora, explicando assim o título. Começo agora meu suicídio.