25.11.05

Não leia, ou leia, Marina

Eu ia fazer um post compartimentando em capítulos tudo aquilo que eu sinto que preciso dizer neste momento. Mas seria mentira – tudo se mistura, na verdade meus mil sentimentos problemas e pensamentos são frutos de uma só fecundação. Só que eu não sei qual fecundação é. Não sei que processos inconscientes vieram gerar em mim o que eu sou hoje. O que eu sou hoje? Um projeto de gente, algo que foi arquitetado por um vento ruim, desenhado tempo após tempo na areia fina de uma praia inóspita, mas sempre um desenho não realizado, não transformado em edifício (orifício...?). Porque às vezes eu acho que eu sou impossível. Como se meus ângulos e medidas não fossem aceitos pela física – a construção não agüentaria em pé, então não se a realiza. E já o desenho não se agüenta, percebe-se o desequilíbrio básico – talvez desejado conscientemente pelo artista-vento. Um desequilibrado. Sempre achei que sou louco (e não num bom sentido), e minhas ações nos últimos dias só vêm me confirmar isso.

Eram assim os dias que eu gostava. Sem sol, nublados, cinzentos, feios. Porque nos dias bonitos há tanta luz que eu não consigo me ver. Não que eu realmente consiga me ver nos dias sem tanta luz, mas já é um pouco melhor, um pouco menos inexistente o meu ser. Hoje eu não estou gostando. Estou me vendo e estou insatisfeito com o que enxergo. Às vezes é melhor a gente não se ver. Por isso odeio espelhos. Por isso quis me convencer, há mais de dois anos, de que odiava alguém, por isso nessa ocasião briguei e gritei com a pessoa. Depois pedi desculpas. Na minha situação atual, ainda não pedi desculpas. Sou péssimo com isso. Porque não sei se vale alguma coisa pedir desculpas sem alguma explicação maior. E eu não tenho essa explicação.

Você parece ter essa explicação, mas acho que você está enganada quando diz que sabe o que é, o que eu ou você fiz ou fez. Porque eu realmente não sei o que foi. Não digo que foi apenas uma brincadeira, claro que não foi, mas eu não consigo entender de onde veio toda aquela raiva, a repulsa, a vontade de ir embora e nunca mais te ver. Ontem, às onze horas da noite, estava eu sozinho no camarim, chorando. Pensei em você e aquilo se dissipou. Mas não consegui mudar meu comportamento. Hoje acordei pensando em você novamente. Daí, li seu e-mail, seus posts, enfim. Espero que você não leia isso agora, pois eu mesmo disse que não queria falar com você assim, por escrito, que queria pelo menos uma vez existir concretamente. Onde? Onde é uma palavra que sempre me agradou. O que, Por que, Quando, Para que, Quem, Como, tudo isso tem no mínimo um sentido abstrato, imaterial. Onde não. Tem gente que usa onde para as coisas mais absurdas. A mente não é um onde. Onde é concreto, onde é corporal. Quero existir onde. Então se você leu isso, pode continuar lendo, mas não deixe que isso vire tudo.

“Se fossemos todos retas”. Existem três possibilidades de posições relativas entre retas. Duas retas podem ser iguais, mas só são iguais quando são a mesma, e portanto isso não é, de verdade, uma posição relativa. Podem ser concorrentes: duas retas se degladiando, mas em um ponto se encostam. Ou paralelas, não há concorrência, mas somente uma imutável inexorável distância. Talvez sejamos todos curvas, e possamos ter dois ou mais pontos se cruzando. Às vezes, idealizo a relação que a senóide tem com o eixo das abscissas. Desejo, no fundo no fundo, que duas retas possam ser iguais sem serem a mesma. Desejo o absoluto. Mas quando fiz um pedido ao absoluto, ele não me respondeu.

Hoje começaram realmente minhas férias, ontem eu cumpri minha última obrigação neste colégio. Não sei o que vou fazer em dezembro – tenho medo de dezembro. Sempre tive muito medo das minhas férias, mas essas... muito a resolver no ócio das férias. Tenho medo de ficar, como sempre fico, dias e dias e dias sozinho em casa, ruminando uma bile escura dura como borracha. Medo de me quebrar em tantos pedaços que, desta vez, eu não consiga juntar antes de voltar ao convívio humano. Medo de deixar as questões sem resposta. Também falo das questões de português, matemática, que terei de resolver em janeiro. Também falo das questões teatrais que terei de desenvolver se quiser ir para Campinas. Mas, obviamente, falo antes de tudo das questões pessoais, que nunca fui muito habilidoso em responder. Se não respondê-las, será que perderei todas minhas amizades ao mudar de cidade? Que salvação terei?

No fundo, sou muito impossível. Não sei como viver. Já admiti: não sei amar, não sei ter amigos, não sei ser membro de uma família, não sei conversar, não sei ser gente. Não sei ser feliz, e mesmo assim sinto que, se um dia me for dada a oportunidade, serei mais feliz do que qualquer pessoa jamais imaginou. Mas como fazer isso? Como me dar a oportunidade? Será que eu vou pra sempre depender da boa vontade do acaso? Não consigo tomar meu destino em minhas mãos, sendo o único responsável por ele, ele não me obedece quando ordeno ou peço que ele mude de direção, faça tal outro caminho.

Tinha muito mais o que falar, mas não quero continuar.

Depois eu falo pra você

Se nós não morrermos antes.

Fim.


(Consegui fazer um post inteiro sem falar de Você. Mas ainda estou apaixonado por você. Não que você fosse achar que não, porque você nem sabe que sim. Mas é sempre bom lembrar.)

1 Comentários:

Blogger Ozzer Seimsisk disse...

Talvez eu não devesse ter lido mesmo.
Mas acho que eu nunca fiquei com tanto medo de você quanto tive hoje, então não teria coragem de não ler.
Me sinto aliás meio idiota, mas tente entender minha posição.

25/11/05 18:08  

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