28.11.04

O centauro, figura que já havia sido brevemente apresentada para vocês, mas que agora - finalmente - tem o destaque que merece aqui

Essência,
à noite a essência
e o cheiro de grama.

A constelação
não é um desenho
e não lhe falta a terceira
Dimensão.

A madeira queima com
um cheiro verde
Ou nem queima,
ontem.

Espuma
jônia: suor
nobre abaixo do
(mistura-se com o)
suor profano, líquido.
Sal rosado e o
outro, marrom. Mas não são.

Mão, braço, uma penugem
loira.
Perna, sexo, pêlo espesso
marrom.

Gosto que nunca
se sentiu.
Não é de morte
ou de não-ser. É, sim,
de vida, de carne, de dor,
de pele, de sangue, de cuspe, de
medo, de sexo.
Sonhos míticos com
a verdade,
quando não era o último.
Lutas hercúleas, amores titânicos,
Idades metálicas.

O centauro sábio
Pensou no mundo( já tendo
corpo).
Foi com o corpo que lutou
contra deuses como ele
imortais.
Os corpos inatos
aceitavam-se e negavam-se
apertavam-se,
gozavam-se e batiam-se
suavam e tremiam.
Não haviam risadas
ou grunhidos ou sonhos.
A luta é pronta,
Mecânica, cinética, física.
A biologia das articulações
Perfeita por dentro.
A estética do sangue,
do homem, por fora.
E o fim só vinha
Se eles quisessem
Quando queriam.

Já tendo corpo, o
centauro sábio teve o
sexo.
Entre as coxas fortes.
Já tendo corpo, o centauro sábio
teve a mente.
Pensou o mundo e os céus e o homem, e
esqueceu de pensar o centauro.
No nada que não lembrou,
queimou-lhe o amor,
num tempo antigo
em que havia amor.
Não amou o centauro,
todos perdidos nas constelações.
Amou o homem que sobre
ele
escrevia poesias épicas sentimentais.
Encontrava-o não no Parnaso,
mas no chão,
cheirando à bosta de cavalo
que limpava antes de Heracles mudar o curso do rio.
Escrevia sua poesia
às noites de folga, pois
era o único momento em que
não estava trabalhando, mas
continuava cheirando a esterco.
O centauro lia-o,
cheirava-o,
tocava-o,
lambia-o,
enquanto ele dormia (muito pouco):
em segredo. O poeta
acordava com um calor
na nuca, na base da coluna
e no calcanhar,
mas o centauro há muito já se fora.
E quando o poeta lavava a merda,
tocava os cavalos
sentindo o único calor vital que já sentira em sua vida órfã.
Seu choro tinha um gosto
igual aos dos suores do centauro.
E isso aconteceu por todos os dez anos da juventude do poeta,
Até que ele morreu pisoteado por cavalos que fugiam da água do rio.

O centauro até hoje
chora sangue. Seus braços
ardem quando lembra do
semi-deus subindo ao Olimpo.
Mas enquanto
se escreve que o centauro
chora sangue e
que seus braços ardem,
(onde?)
o centauro vê o poeta
escrevendo sobre sangue
e suor
e amor.


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O centauro não conhece luzes azuis vítreas. A luz que o centauro conhece é a dos vaga-lumes, porque o Sol, a Lua, as estrelas, esses não se pode conhecer. Ou se pode conhecer a matéria, a física e a química, mas não a luz.
A luz dos vaga-lumes não é produto de uma reação química, mas do sentimento noturno do solo.

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O centauro sou eu e, por isso, uma projeção personificada de todo o meu desejo, meu anseio. Le centaur, c’est moi.
Minha razão.
Meu anseio pela sabedoria.
Minha carne.
Meu anseio pelo outro.
Meu vazio.
Meu anseio pelo Homem.

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Por que ficam juntos o poeta e o centauro?
(Ficam?)
São, é claro, a mesma pessoa
e se amam. O que quer dizer?
Se um é imortal
E o outro vive sempre, em corpos diferentes,
O que é o amor?
deles?


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O centauro
luta e corre
galopa em direção ao mar
ao Oceano Atlântico ou
ao Mediterrâneo
para lá morrer.
O centauro
pensa e sente
olha pela janela o poeta
que escreve
e dorme.

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Que espécie de imagem arquetípica é o centauro? Que essencial espírito inconsciente ele representa? Por que o centauro é? O que está por trás de sua eternidade? Que runa antiga foi tatuada em sua nuca, escondida pelos cabelos longos e castanhos, num tempo anterior ao tempo e ao centauro?
Onde se esconde sua infância que nunca aconteceu? Que vaso raro e místico pode contê-la? E à sua velhice que jamais poderá vir ao mundo? Como podem esses dois tempos existirem se não acontecem?
O que é o brilho de seu pêlo?

1 Comentários:

Blogger Artur disse...

Ser De Sagitário
Adriana Partimpim
Composição: Péricles Cavalcanti

Você metade gente
e metade cavalo
Durante o fim do ano
cruza o planetário

Cavalga elegância
Cabeça em pé de guerra mansa
Nas mãos arco e flecha
Meu coração
Aguarda e acompanha
seu itinerário
Até o fim do ano
ser de sagitário

Você metade gente
e metade cavalo

21/1/05 23:51  

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