19.12.04

Estou Só

Saíram da casa todos, agora só o silêncio reverberando em cada uma das paredes reverberantes e silenciosas. Cada quadro respira aspirando a uma nova condição, a de Ser sem razão de ser. Seu significado é nulo, sua significância é nenhuma. Os porta retratos esperam que seu vidro rache e o pó sólido e minúsculo viaje com o vento para todas as direções. Mas nem um movimento quebra o silêncio ansioso da casa vazia. Todos partiram, e os móveis inquietos não se movem, esperando que alguma coisa importante aconteça. Mas nada acontecerá, por dias e dias e dias. Mesmo se quisessem, não seriam capazes de se mover. Lá fora, um cachorro uiva.

Lá fora, nada tem fim. O "Fim" não existe. Nada existe. A vida é imensa como o mar, e incognoscível como o mar. Quem seria capaz de compreender a existência do mar, em toda sua grandeza? O mar real, de verdade, não a representação dele que se tem em mente. Não o que se acha que se sabe. O estranho embrulho no peito, a sensação de grandeza além do abraçável. O mar é grande demais. A vida é grande demais. A vida não tem explicação. A vida não se explica pela física, pela filosofia, pela psicologia, pela biologia. É apenas descrita ou interpretada, mesmo que porcamente. Mas não explicada. A vida não se explica na alegria de um sorriso, no calor extravasado dos abraços ou na brancura vazia caótica dos carinhos. A vida não cabe em metáforas, em metonímias. A vida nos consome, nos liberta. A vida vive, respira. Pode o amor explicar a vida? Não -- porque a vida, como a essência inexpressiva de deuses e demônios mortos, não se faz somente de amor. A vida preenche-se de vazios e se aterroriza com a possibilidade do concreto inprescindível. A vida é um paradoxo completo sem perfeições.
Pode a música explicar a vida? Ora pode a música explicar a música? Pode a arte, explodindo em sua significância errada em milhares de possibilidades inventadas, reduzir-se à verdade e à inconstância deste mundo imenso? A existência não cabe na bienal. Doe sua essência para um bloquinho. A morte é apenas uma possibilidade. Nada pode ser provado impossível. Mas a música não cabe num quadro. Não cabem as artes em seus respectivos invólucros inválidos! A verdadeira arte extravasa solitária e viva por entre os corações dos homens, ou em última análise suas barrigas. A dança é uma arte, mesmo uma dança herege, a uma música inapreciável. A dança como uma forma de morrer antes de amanhã. Pois a música é som, é luz, é cor e movimento; é cheiro no despertar das lembranças e das sensações estranhas; é o sentimento completo a completar o instante, é o transcender em forma de notas fora de escala, é o tthramnsd. A música não é explicável.

Nada importa.
O fim não existe de verdade. Também o infinito é uma invenção.
"Para sempre" e "nunca mais" não fazem sentido aos ouvidos dos deuses, quanto mais aos dos homens. Piruá de gente... A morte como apenas uma outra chence de viver a vida. Depois do fim, a morte, e nesse corpo a vida seria uma ilusão: física sim, mas não a sensação de que ainda existe. A sensação oca de que tudo acabou, quando acaba. Mas nunca acaba. Tudo se transforma, lenta e dolorosamente, até que nossos fôlegos acabem ao mesmo tempo. Nada dura para sempre. Nada deixa de existir. Onze dimensões. Apenas onze...

(não aguento mais)

Eu sou só
Estou só
Só serei seu se for só
Eu sou só

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