27.8.05

Serafim

Ou muito me engano, ou acabo de escrever um post inútil. E ruim. E sem qualquer interesse para todos vocês. Perdão, perdão, perdão. Mil vezes, perdão.
[Perdão é uma coisa que eu deveria pedir mais, mesmo não acreditando no perdão. Perdão, por favor, perdoem-me. Pelo tempo que gastaram comigo aqui nesse blog inútil.] Mas ele há que ser inútil, ou perde sua utilidade. Mas será, no mínimo, diferente (no máximo, esquisito, mas não tenho de modo algum essa ambição) de todos os outros posts meus.

Entendam isso como um post assim:
Um “Post-pra-você” pra mim.
[a rima não era intencional,
Mas até que a poesia ficou legal.
Exceto por essa outra rima.]

I – Dedicatória

DEDICATÓRIA. Episódio de linguagem que acompanha todo presente amoroso, real ou projetado, e, mais geralmente, todo gesto, efetivo ou interior, pelo qual o sujeito dedica alguma coisa ao ser amado.

1. O presente amoroso é procurado, escolhido e comprado na maior excitação – excitação tal que parece ser da ordem do gozo. Calculo diligentemente se esse objeto agradará, se não decepcionará, ou se, ao contrário, parecendo desmesurado, não denunciará por si mesmo o delírio – ou o engodo no qual estou envolvido. O presente amoroso é solene; arrastado pela metonímia devoradora que rege a vida imaginária, transporto-me integralmente nele. Através desse objeto, dou a você meu Tudo, toco você com meu falo; é por isso que fico louco de excitação, que percorro as lojas, que me obstino a encontrar o fetiche certo, o fetiche brilhante, exato, que se adaptará
perfeitamente a seu desejo.
O presente é toque, sensualidade: você vai tocar o que eu toquei, uma terceira pele nos une. Dou a X... um lenço de pescoço e ele o usa: X... me dá o fato de usá-lo; e é aliás assim que, ingenuamente, ele concebe a coisa e diz.
A contrario: toda moral da pureza requer que se separe o presente da mão que o dá ou recebe: na ordenação budista, os objetos pessoais, as três vestimentas são oferecidas ao bonzo sobre um andor; o monge as aceita tocando-as com um bastão, não com a mão; assim, no futuro, tudo o que lhe for dado – e do que ele viverá – será disposto em cima de uma mesa, no chão ou sobre um leque.

2. Tenho este medo: que o objeto dado não funcione bem, devido a uma imperfeição maliciosa; se é um porta-jóias (quão penosamente achado), por exemplo, a fechadura não funciona (mesmo a loja pertencendo a mulheres de sociedade; e, ainda por cima, o nome dessa loja é “
Because I love”: seria pois porque amo que não funciona?). O gozo de presente, então, extingue-se, e o sujeito sabe que o que ele está dando ele não tem.

(Não damos apenas objetos: X... estando em análise, Y... também quer se fazer analisar: a análise como dom de amor?)

O presente não é forçosamente um lixo, mas tem, de todo modo, vocação de dejeto: o presente que recebo, não sei o que fazer com ele, ele não se ajusta a meu espaço, atravanca, é demais: “Que tenho eu a ver com seu dom!” “
Seudom” torna-se o nome-farsa do presente amoroso.

3. É um argumento típico da “cena” o representar ao outro o que lhe damos (tempo, energia, dinheiro, engenho, outras relações, etc.); pois é provocar a réplica que faz funcionar qualquer cena:
E eu! e eu! O que é que eu não te dou! O dom revela então a prova de força da qual é o instrumento: “Eu te darei mais do que você me dá, e assim eu te dominarei” (nos grandes potlachs [dom ou destruição de caráter sagrado; o beneficiário do dom tinha o desafio de oferecer um dom equivalente ao donatário.] ameríndios, era assim que se queimavam aldeias, se degolavam escravos).

Declarar o que dou, é seguir o modelo familiar: veja os sacrifícios que fazemos por você; ou ainda: nós te demos a vida
(- Mas que tenho eu a ver com essa bendita vida! etc.). Falar o dom é colocá-lo numa economia de troca (de sacrifício, de sobrelanço, etc.), a que se opõe o gasto silencioso.

4. “A esse deus, ó Fedro, dedico este discurso...” Não podemos dar linguagem (como fazê-la passar de uma mão para outra?), mas podemos dedicá-la – pois que o outro é um pequeno deus. O objeto dado é reabsorvido no dizer suntuoso, solene da consagração, no gesto poético da dedicatória; o dom é exaltado já pela voz que o diz, se esta voz é medida (métrica); ou ainda: cantada (lírica); é o princípio mesmo do
Hino. Não podendo dar nada, dedico a minha própria dedicatória, no que se absorve tudo o que tenho a dizer:

“A la très chère, à la très belle,
Qui remplit mon coeur de clarté,
A l’ange, à l’idole imortelle...”

O canto é o suplemento precioso de uma mensagem vazia, inteiramente contida eu seu endereçamento, pois o que dou cantando é ao mesmo tempo meu corpo (através de minha voz) e o mutismo com o qual você o golpeia. (O amor é mudo, diz Novalis; apenas a poesia o faz falar.) O canto nada quer dizer: é por isso que você entenderá por fim que o estou dando a você; tão inútil quanto o fiapo de lã, a pedrinha, oferecidos à mãe pela criança.

5. Impotente para se enunciar, para ser enunciado, o amor quer entretanto se gritar, se exclamar, se escrever por toda parte: “
all’acqua, all’ombra, ai monti, ai fiori, all’erbe, ai fonti, all’eco, all’aria, ai venti...”. Por pouco que o sujeito amoroso crie ou monte uma obra qualquer, é presa de uma pulsão de dedicatória. O que ele faz, ele quer imediatamente, e mesmo antecipadamente, dá-lo a quem ele ama, por quem ele trabalhou, ou trabalhará. O sobrescrito do nome virá dizer o dom.

Entretanto, salvo o caso do Hino, que confunde o envio e o próprio texto, o que se segue à dedicatória (a saber, a própria obra) tem pouca relação com essa dedicatória. O objeto que dou não é mais tautológico (dou a você aquilo que dou a você), é
interpretável; tem um sentido (sentidos) que ultrapassa de muito seu endereçamento; por mais que eu escreva seu nome em minha obra, é para “eles” que ela foi escrita (os outros, os leitores). É pois por uma fatalidade da própria escrita que não se pode dizer de um texto que ele é amoroso, mas apenas, a rigor, que foi feito “amorosamente”, como um bolo ou uma pantufa bordada.
E mesmo: menos ainda que uma pantufa! Pois a pantufa foi feita para seu pé (seu número e seu prazer); o bolo foi feito ou escolhido para seu gosto: há uma certa adequação entre esses objetos e sua pessoa. Mas a escrita, esta não dispõe desta complacência. A escrita é seca, obtusa; é uma espécie de rolo compressor; segue em frente, indiferente, indelicada; preferiria matar “pai, mãe, amante” a se desviar de sua fatalidade (de resto enigmática).
Quando escrevo, devo me render a esta evidência (que, segundo meu imaginário, me dilacera): não há nenhuma benevolência na escrita, há, antes, um terror: ela sufoca o outro que, longe de nela ver o dom, ao lê uma afirmação de domínio, de poder, de usufruto, de solidão. Donde o paradoxo cruel da dedicatória: quero a todo preço dar a você o que o sufoca.

(Verificamos muitas vezes que um sujeito que escreve não tem de modo algum a escrita de sua imagem privada: quem me ama “por mim mesmo” não me ama pela minha escrita (com o que sofro). Sem dúvida, porque amar ao mesmo tempo dois significantes no mesmo corpo é demais! Isso não é nada comum. E se por exceção isso acontece, trata-se da Coincidência, do Soberano Bem.)

6. Não posso pois dar a você o que acreditei escrever para você, é a isso que devo me render: a dedicatória amorosa é impossível (não me contentarei com um sobrescrito mundano, fingindo dedicar a você uma obra que nos escapa a ambos). A operação na qual o outro é envolvido não é um sobrescrito. É, mais profundamente, uma inscrição: o outro está inscrito, inscreveu-se no texto, deixou seu rastro, múltiplo. Se, deste livro, você fosse apenas o dedicatário, você não sairia de sua dura condição de objeto (amado) – de deus; mas sua presença no texto, pelo próprio fato de você ser aí irreconhecível, não é a de uma figura analógica, de um fetiche, é a de uma força que não está, conseqüentemente, em repouso absoluto. Pouco importa, pois, que você se sinta continuamente reduzido ao silêncio, que seu próprio discurso pareça-lhe sufocado sob o discurso, monstruoso, do sujeito amoroso: em
Teorema, o “outro” não fala, mas inscreve alguma coisa em cada um daqueles que o desejam – opera o que os matemáticos chamam de catástrofe (o abalo de um sistema por um outro): é verdade que aquele mudo é um anjo.

II - Dedicatória

Estou triste estou triste
Estou desinfeliz
Ó maninha Ó maninha
Ó maninha te ofereço
Com muita vergonha
Um presente de pobre
Esses versos que fiz
Ó maninha Ó maninha.

III – O Discurso Amoroso Sem o “B”

J, X, Z é compreensível, são letras meio chatas, nem servem pra muita coisa, nem têm muito uso, nem tinham que estar lá. E realmente não há grandes palavras com J, X, Z sobre as quais se discursar em um Fragmentos de um discurso amoroso.
Mas B?

Como falar sobre amor sem essa divina entre as divinas letras alfabéticas?

Como não falar em Bêijo?

Como não falar no Brilho?

Como não falar em
Beleza.

O Bom, o Belo, o Berdadeiro.

O Bestial

O Banal

O Bis...

O Bacana, o Banana, a Batata, a Bisteca... Bico, Biquinho...

Como escrever um livro acerca do discurso amoroso sem falar das palavras que começam com B? Como não falar em Bunda? Como não falar em Briga? Como não falar em Búfalo?

Mas o Brilho e o Beijo...

Beleza.

Boniteza.

AUSÊNCIA. Desse esquecimento, bem depressa acordo. Prontamente instauro uma memória, uma perturbação. Uma palavra (clássica) vem do corpo, dizendo a emoção da ausência: suspirar: “suspirar pela presença corporal”: as duas metades do andrógino suspiram uma pela outra, como se cada sopro, incompleto, quisesse se misturar ao outro: imagem do beijo, na medida em que este funde as duas imagens numa só: na ausência amorosa, sou, tristemente, uma imagem descolada que seca, amarelece, encarquilha-se.

Como falar em discurso amoroso sem sequer mencionar você?
Você que outra vez já não foi você... e agora?

ENTENDER. Saindo do cinema, sozinho, remoendo meu problema amoroso que o filme não me pudera fazer esquecer, tenho este grito estranho: não: quero que isso acabe! mas: quero entender (o que está acontecendo comigo)!

INCOGNOSCÍVEL. ...sou muitas vezes surpreendido por esta evidência: o outro é impenetrável, inapreensível, intratável; não posso abri-lo, remontar à sua origem, desvendar o enigma. De onde vem? Quem é? Estou exaurido, jamais o saberei.

CARINHO. Não é apenas necessidade de carinho, mas também necessidade de ser carinhoso para com o outro: envolvemo-nos numa bondade mútua, maternalmente nos embalamos um ao outro; retornamos à raiz de toda relação, ali onde necessidade e desejo se encontram. O gesto carinhoso diz: peça-me tudo que possa adormecer seu corpo, mas não esqueça também que o desejo um pouco, levemente, sem nada querer agarrar imediatamente.

A, E, I, C, faltou o B novamente.
Acho que é porque o B é a letra amorosa por essência, e assim está contido um pouquinho em cada um dos verbetes das outras letras. Porque não dá pra falar dos outros sem B, e seria infinitamente complicado falar do B por si só. Por que, ah, o B é todo um mundo, mas um imundo de desordem de amor!

IV – Começos de frases de um diálogo secreto

- Que bom! [aqui o autor deve dar uma pausinha para comentar: este trecho do post foi escrito na quinta-feira, dia 25 de agosto, ou seja, antes da conversa com a pessoa conversada, ou seja, a conversa aqui colocada é uma hipótese totalmente imaginada. No entanto, a conversa se deu hoje, 26, e o “Que bom” foi o mesmo.]
- Não, não é.
- Por que não?
- Primeiro, não é ______.
Segundo, não é.
Terceiro, não gosta...
Quarto, vide primeiro e segundo.
Quinto, eu não sei (se é, se gosta, se sou, se gosto, se sei, se sabe...)
Sexto, olha pra ____.
Sétimo, olha pra _____.
Oitavo, mesmo se ______, eu não _______.
Nono, não _______.
Décimo, ______-me _______.
Décimo primeiro, você já ___________?
Décimo segundo, *suspiro*, aquela velha questão: ______.
Décimo terceiro, é ___________.
Décimo quarto, sou _____.
Décimo quinto: não é _________ a_s______.
Décimo sexto, jamais _ _ _ _ _ e em lugar algum __ __ __ __.
Décimo sétimo, __e ___ __ ___.

amor – paixão – de mim – dele – quem eu sou – quem tu és – o que estou sentindo – o que tenho direito de sentir – fosse do jeito que deveria ser – Deus me odeia – foda – olha – agora – quando poderei – auto-estima – viver minha vida – acho que não – poderia tomar coragem – de mim – como eu – próximo a mim – dentro dele – dentro de mim – livros – garotas – coração e mente – guerra dentro da gente – verdade – beleza – brilho – beijo – bem – boicote – boi – bestial – bumerangue – berlinda – blimunda – baltazar – bocha – braço – bingo – boxe – é impossível e pronto, cabou, entenda, não tem mais nada pra dizer, jamais será nem que tudo confluísse a favor – Deus me odeia – de mim – beijo – me odeia – ele me odeia – ela me odeia – nós me odiamos – vós me odiais – eles me odeiam – eu me odeio – tu me odeias?

V – Papel

Que irônico... justo no momento em que, como diria uma pessoa, um papel passa a sugar minhas horas de modo que eu não tenho tempo para ser, para ser artur, para ser vivente, para ser amante, para ser sentinte, eu percebo que sinto, sim. Ou que senti, já que não tenho mais tempo para sentir.

Descobri que sentir tem muitos sentidos mais do que eu pensava, e que a paixão é algo muito mais amplo. Que a paixão pode ser amorosa, mas pode ser amizade apaixonada, que pode ser gosto apaixonado, que se pode apaixonar por tudo um pouco. Talvez até o que eu sinta por você seja uma dessas paixões alternativas recém-descobertas... ou talvez não seja paixão... ou talvez seja um gostar...

O que é gostar?

Sabe, devia haver definições fixas pra essas coisas. Devia haver uma tabelinha dizendo os limites de cada um:
Indiferença=
Estar afim=
Gostar=
Estar apaixonado=
Amar=
E o problema nem é os dois últimos, como alguns poderiam pensar, mas justamente os primeiros, pois que as diferenças são mais sutis e as graduações foram determinadas mais recentemente. Acho.
De qualquer jeito, devia haver essa tabela...

Assim, poderia afirmar: gosto. Não, não gosto, amo. Não, não amo, estou afim.

Mas que complicação há nessas histórias, e o que as pessoas usam levianamente todos esses termos, e quando eu tento fazer o mesmo, mesmo em uma situação totalmente inocente e na qual um erro nem teria tanta importância, a única coisa que eu consigo pensar é:

“Quando a alma fala, já não fala a alma.”

E assim me paraliso na idéia de que eu não sinto, afinal, como saber que eu sinto? Aí então me veio uma nova idéia:

Ou melhor, a comprovação de uma idéia antiga:

Amor não é sentimento.
Ou melhor, é também sentimento.
Mas não só.

Amor é um estado de existência: ser amando ou existir amando, ou ser não amando.
Pois se amor fosse sentimento, dever-se-ia senti-lo, e acho que muitas vezes (talvez na maior parte delas) não o sentimos, apesar de o termos presente. Então o sentimento deve ser uma parte pequena do amor, e isso não só com o amor. Talvez com tudo, sei lá, talvez...

Mas ainda assim, me dá um tremendo receio falar sobre o amor. Porque:

- eu não sei.

E se não sei, posso estar errado, e se posso estar errado, todo esse texto enorme e confuso e perdido que escrevo pode não ter nenhum valor de verdade, e se o caso é esse então o melhor seria jogá-lo no lixo, mas por favor alguém dê valor de verdade ao meu texto porque se eu não conseguir publicá-lo vai demorar muito pra eu conseguir publicar aqui qualquer coisa, então vai estar me faltando por muito tempo esse pouquinho de sublimação, esse desabafo em doses homeopáticas que sempre foi o pato pra mim.

E, aí, “eu te dou certeza de que surtaria”. (Que irônico...)

VI – Bêijo

Vide Bico.

Mas também: os pessegueiros que me perseguem, pessoas presas ao possível passo de uma paciente Pessoa. Pessoa que me tem a posse. E o v-v-v do bambú.

Sabe, essa história de beijo é meio esquisita (e melada). E eu sou o anti-melado (exceto quando eu fico, como disse o Finho, açucarado, mas isso é só com ele). Será que eu sou o anti-melado?

Sei lá, o beijo parece ter muito mais importância do que o Bêijo, mas na verdade é o contrário. Importante é o Bêijo, porque ele é inovador e revolucionário e dialético e verdadeiro e pleno de significado e quente, não é apenas o contatoatoato...

O Bêijo, é claro, é um Sônho. Mas os sonhos são coisas esquisitas, não? No começo do ano, demorou muito para eu me acostumar com o sonho como realidade (idéia que o professor pedro não deixava de defender, e que hoje eu já apreendi), e é uma grande verdade, o sonho é uma grande verdade. E todos no sonho sou eu mesmo, mas se Você estava no meu sonho depois do filme Sonhos de Kurosawa é porque é um pouco você mesmo, é a imagem de você da qual eu falarei numa outra parte desse post que ainda está por vir, é porque é Você e não Outro, oras! E era porque era você e porque era o Yuri e a Marina na roda cantando e pulando e comemorando.

E eu queria mesmo que fossem vocês a comemorar comigo, e não uns amigos que eu farei ano que vem em Campinas.
Porque sim, eu gosto de vocês. Mesmo os odiando.


VII – Brilho

Eu? Não, não eu. Não, Maria.

A Maria estava errada. Brilho é você.

E olha, isso eu já pensava antes de dois meses atrás, então deve ser verdade (pois eu não confio nas minhas opiniões de dois meses pra cá, pelo menos não nesse assunto em particular).

Mas uma questão permanece: não fica meio uma “obrigação” gostar de você considerando a existência de tal brilho (e disso eu já falei muito quando discutia o Capitalismo das Relações, mesmo que ninguém tenha entendido naquele momento – ou em qualquer momento)? Não fica um gostar pré-fabricado? E, portanto, artificial?

Mas o brilho em si é positivo (não como as qualificações das quais eu falava no CapitalismoInterRelacional). É sim, e se algum dia eu puder te falar isso acho que vale a pena, você merece saber. Mas eu não mereço ter de te contar...

Mas isso de "merece-não-mereço" vai na mesma linha do já há muito discutido "inagüentável": palavras inúteis e idióticas.

O que importa é o Brilho. Porque, das palavras com B, é a melhor: das quatro, só duas são concretas. Das duas, só essa é algo elevado, profundo, completo, verdadeiro... Mas por que então eu não consigo falar sobre esse brilho? Acho que é porque ele é o centro do post, o centro da questão, o centro dos sonhos e das conversas e das leituras e das reflexões. O seu brilho. Como a letra B, ele está presente em todas as outras partes do texto, e portanto é repetitivo e, principalmente, impossível falar dele separadamente. Então desisto, mas não sem antes dizer gramaticalmente: Você brilha. (Verbo intransitivo.)

VIII – Beleza

Para os gregos, Bom = Belo. Não chego a tanto, mas também não sou tão hipócrita a ponto de negar a importância da beleza.

Fotos, olhares, imaginações... em todos há beleza... principalmente nessas últimas...
A sua beleza. Não boniteza, beleza (tão falsa e pequena quando a boniteza, mas com algo de esteticamente artístico) - será você uma escultura de estilo clássico? Um David, uma Vênus de Milo, um Minotauro, uma Hárpia, um Ulisses, uma Sirene, um Deus, uma Deusa,
uma coluna? Lisa, geométrica, ideal como as idéias platônicas...

Mas não, sua beleza não é nada platônica, é nietzschiana, não que não haja nela o equilíbrio apolíneo das esculturas gregas romanas renascentistas etcs, mas o que há de dionisíaco é muito superior, o que há de dionisíaco está em suas proporções, no desenho de seu nariz, de seus braços vistos nus, de seus cabelos ora assim ora doutro jeito, de seus pés, de seus pêlos poros pintas. Como se você tivesse nascido de um enorme tanque de uvas pisadas com os pés de dezenas de trabalhadores e trabalhadoras descalços numa enorme festa criadora de vinho, trabalhadores e trabalhadoras que depois virarão mulheres e homens que beberão o vinho numa festa báquica, numa orgia, e enfiarão censuras em censuras até cansar, mas depois deitarão ternamente e se amarão paralizados, sem sexo mas apenas olhares, e isso, minha gente, é a arte. Ou será você? Que em sua alma se instaurasse essa orgia seria compreensível, mas mas compreensível seria se as uvas fossem substituídas por espinhos, e a orgia se desse, mas se desse em meio ao sangue que escorre, e que por escorrer demais matará seus donos, mortos justamente no momento de amor parado, e seus olhos vão fechando fechando fechando e a última imagem que eles vêm é a sua.

Mas por que eu às vezes esqueço dos seus traços? Por que às vezes eu tenho de me esforçar pra me lembrar de como seu rosto é desenhado pela luz? Eu não deveria sabê-lo de cor, sabê-lo mesmo nos momentos inoportunos, sabê-lo mesmo sem querer sabê-lo, sabê-lo mesmo quando eu já esqueci de quem é você (pois para me lembrar de você e pensar em você eu preciso, não é Barthes?, me esquecer de você às vezes)? Eu não deveria sabê-lo? Então por que o perco?
E que angústia é esse perder...

IX – Bico

Há sempre uma protuberância, um biquinho, uma ponta que se deixa ficar para fora de modo que em algum ponto eu consiga me agarrar.

Acho que grande parte do gostar é – além de tecer a solidão (como os galos - um que apanhe esse grito que ele e o lance a outro; de um outro galo que apanhe o grito de um galo antes e o lance a outro; e de outros galos que com muitos outros galos se cruzem os fios de sol de seus gritos de galo – tecem a manhã) – fantasiar. É imaginar. É:

POR QUÊ. Ao mesmo tempo que se pergunta obsessivamente por que não é amado, o sujeito amoroso vive na crença de que, de fato, o objeto amado o ama, mas não lhe diz.
(...)
A verdade é que – paradoxo exorbitante – não deixo de acreditar que sou amado. Alucino o que desejo. Cada mágoa vem menos de uma dúvida que de uma traição: pois apenas aquele que ama pode trair, apenas aquele que se crê amado pode ser ciumento: o outro, episodicamente, falta ao seu ser, que é de me amar, tal é a origem de meus infortúnios. Um delírio, contudo, existe apenas se dele despertamos (só existem delírios retrospectivos): um dia, entendo o que me aconteceu: acreditava sofrer por não ser amado, e era contudo por acreditar sê-lo que sofria; vivia na complicação de me acreditar ao mesmo tempo amado e abandonado. Qualquer um que tivesse ouvido minha linguagem íntima só poderia exclamar, como fazemos com relação a uma criança difícil:
mas, afinal, o que ela quer?

Sabe, seu ser é algo muito pessoal, você tem posse sobre ele. Será que eu tenho direito de fantasiar sobre você? Afinal, poderiam dizer que eu não estou usando o seu ser em minhas fantasias e Sônhos, mas uma imagem de seu ser que eu criei (e que portanto é minha), mas será que as coisas são tão separadas?

Tenho duas hipóteses contrárias a essa separação radical:

Primeiro, digo que se eu sonho você de um determinado modo, isso muda minha relação com meu meio, e portanto pode chegar a atingir você, principalmente COM CERTEZA chegará a você quando novamente - o que talvez nunca aconteça, efeito Artur me faz lembrar - nos conversarmos, pois eu estarei muito condicionado por tudo (e muito por este texto de agora). Então, você deveria me impedir de usar sua imagem em meus sônhos.

Segundo, digo que não é impossível que num plano supralunar haja uma conexão entre idéias, conceitos, essências, naturezas, imagens, seres. E quanto mais alto vamos na pirâmide-Mundodasidéias mais essa conexão se fortalece (passando a substituir, talvez, as coisas em si), e assim a imagem que eu tenho de você realiza um veredante caminho até se ligar a você mesmo: imagem -> idéia -> conceito -> essência -> natureza -> ser. E então meus sônhos não só afetam você, mas você afeta meus sonhos, e não tem essa história de eu gostar 'de uma imagem falsa que construí de você' (um totem?), mas você e sua imagem são de certa forma um só, e então você tem uma passagenzinha para minha alma, e você deveria não me impedir de usar sua imagem, mas incentivar esse uso de modo que pudesse adentrar em minha psique, se é que já não entrou, se é que essa não é a última coisa que você quer. Afinal, talvez você me odeie. Mas nesses caminhos imbricados de idéias e existências, e mesmo com seu ódio, haverá sempre uma alça, um loop, uma protuberância como um inchaço no teto do boxe, no qual eu poderei me agarrar até que nasça um bebê ou não. Mas isso vai ter que se mostrar aos meus olhos.


X – Tempo (dois meses que eu achei que eram uma semana)

Da última vez, não lembro quanto tempo demorou para que eu percebesse. Maio/2003. Mas, por mais que eu não consiga me lembrar DESTA parte, não percebi assim diretamente. Foi transicional, gradual, e talvez até tenha passado por um ponto do agora. Mas o fato é que naquela vez eu tinha tempo para pensar sobre o assunto e aceitar ou negar, mas hoje tanto não tenho tempo que não faz muita diferença se sim ou se não, porque as possibilidades reais de ação (e não é a ação o que realmente importa na nossa idiótica existência?) serão as mesmas para ambos os casos, ou seja, nenhuma possibilidade, nenhuma não.

Mas quanto tempo eu vou precisar para perceber ISSO? Porque eu posso tê-lo escrito aqui, mas não percebi de verdade não.

E se a resposta for sim, talvez a percepção dessa realidade não aconteça, talvez não possa acontecer com uma resposta sim, por quê eu não sei, mas gostaria de saber, aliás essa coisa de gostar e de sentimento é muito esquisito e anti-fenomenológico, por mais fenomenológico que seja. É um paradoxo, que nem as prostitutas do benjamin.

Você bem que podia ser uma prostituta do benjamin. E não se ofenda: o Benjamin era um grande filósofo (ou estará ele ainda vivo? Duvido muito...), não haveria de ter más prostitutas. Seria grandioso, se prostituir para um dos maiores filósofos de nossa época, algo como a elevação à milésima potência da história da Puta Filosófica da Ditadura, Buraco Paula. Mas você não, você não é prostituta, é uma estátua, e essa estátua é algo do passado, não é uma escultura abstrata como as de hoje, é algo da antigüidade (mesmo sendo tão adolescente), e portanto inalcançável, distante temporalmente de modo que não consigo não posso te alcançar!

Mas eu quero! Quero sim!

E eu vivendo minha vida e penso em você de novo. Daí eu penso "poxa, já deve fazer umas duas semanas que eu tô pensando" em você, e eu faço as contas e percebo que não, que são dois meses, e que dois meses é coisa pra caramba se você der uma olhada nas minhas experiências passadas, e porra desde dezembro de dois mil e três que eu não me encontro numa situação como essa, eu já nem sei como é que se fica deprimido por paixão, sei me deprimir por todas as outras coisas do mundo, mas a capacidade de se deprimir por paixão ficou lá atrás em dois mil e três, por isso a paixão - cegueira, pathos, neblina, diadorim Diadorim DIADORIM!!! (acabo de descobrir algo... ou não) - não é aprendizado, é só vivência pontual presente e intranscendental. A não ser que haja algo mais que force a transcendentização da paixão. Intranscendental porque inibe nossa liberdade. Inibe nossa liberdade porque...

Por quê? E não me venham com os clichés que pra mim não funcionam.

Talvez justamente porque é intranscendental, mas aí entraríamos num ciclo vicioso e o post não acabaria nunca.

XI – Silogismos


“Todo viver real é encontro”.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, meu viver é desreal.

Todo viver é real.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, nem todo viver real é encontro.

Todo viver real é como o meu.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, todo viver real é desencontro.

Todo desencontro é trágico.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, meu viver é trágico.

Todo desencontro é fruto de impossibilidades imutáveis.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, meu viver é fruto de impossibilidades imutáveis.

Todo viver é compartilhado.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, meu desencontro é compartilhado.

Todo viver é finito.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, meu desencontro é finito.

Todo viver é possível.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, meu desencontro é possível.

Todo viver é passível de mudanças.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, meu desencontro é passível de mudanças.

O desencontro fundamental humano é imutável.
Ora, meu viver é desencontro.
Logo, meu desencontro é imutável.

* * *

Todo amor é belo.
Meu amor não é belo.
Meu amor não é amor.

Todo amor é amor.
Meu amor é amor.
Meu amor é amor.

Todo amor é amor.
Meu amor não é belo.
Nem todo amor é belo.

Mas eu nem amo... então por que falo disso?


XII – Neotrovadorismo, Neoclassicismo, Neobarroco, Neoarcadismo. E as novas possibilidades.

O Sol, o mar...

Vivenciei uma paixão na época de aprendizados poéticos perigosos... hoje, já não sei como seria... qual seria minha válvula de escape agora que já não vivo o amor literário?

Talvez eu voltasse a escrever de verdade... talvez a única forma possível de comunicação pseudoliterária continue a ser essa merda deste blog... talvez nem isso, e esse texto que escrevo neste momento seja o último testemunho de qualquer coisa que seja na minha vida.. mas é interessante pensar que o sentimento, o "coração" vai ter o poder de trazer de volta minha capacidade de escrever, pois como eu gostava de escrever!, e mesmo que a dedicatória seja algo esquisito (e tudo aquilo que o Roland B. colocou no trecho citado na primeira parte do texto), eu gostaria de escrever para você, mesmo escrevendo para os leitores e você tendo apenas seu nome na primeira página (ou nem isso, já que eu jamais falarei a você que você é você), você estará ativamente presente no resto, você nos meus versos em prosa e que não são versos porque eu não sei versar além de:

"Desligado ou
Fora da área de cobertura;
Bloqueado
Sem serviço – Sem crédito ou baterias.

Sem uso ou função – obsoleto, ultrapassado.

Quebrado, desconectado, destroçado, destroncado
Deslocado, desviado
Transviado



Deu pau."

que, admitamos, é cocô literário sentimentalóide, e eu esqueci que

"Eu canto porque o instante existe
e a minha vida está completa.
Não sou alegre nem sou triste:
sou poeta.

Irmão das coisas fugidias,
não sinto gozo nem tormento.
Atravesso noites e dias
no vento.

Se desmorono ou se edifico,
se permaneço ou me desfaço,
- não sei, não sei. Não sei se fico
ou passo.

Sei que canto. E a canção é tudo.
Tem sangue eterno a asa ritmada.
E um dia sei que estarei mudo:
- mais nada. "

e não deveria ter esquecido, porque é tão básico quando se quer poetar.
Mas não sou poeta e não deveria mesmo poetar...

Mas se, SE, SE eu gostar de você, então eu estarei fadado à poesia. In
felizmente.

XIII – “Quien con veros pena y muere,/ qué hará cuando no os viere?”

Pois realmente eu não te vejo faz muito tempo. E tão raramente te vejo! E quando te vejo, é tão pouco, tão de longe, tão superficial! Queria abrir sua boca e olhar sua garganta com uma lanterninha... queria ver balançar aquele pendulozinho cujo nome eu sempre esqueço... queria olhar as sujeiras dentro de seu nariz... queria com aquele aparelhozinho da minha mãe ver uma inflamação dentro do seu ouvido. Queria abrir seus olhos com os dedos e tirar suas remelas.

Mas não queria ver sua alma, ainda não.

E aqui reside o verdadeiro problema, pois eu não te vejo e não te conheço. Você não está cansada, Marina, de viver ao meio de opacidades? Eu estou, pois sim, e você (não a Marina, Você) dentre as opacidades é provavelmente a maior, mesmo que eu não tenha perguntas a te fazer como tenho às outras pessoas.
E aqui reside o verdadeiro problema, pois eu não te vejo e não te conheço, então como poderia passar pela minha cabeça que eu gosto de você?, também não sei, de fato é estranho, mas passar passou e agora passado está, e agora resta saber: gosto ou não gosto ou não gosto ou não gosto? e resta também saber: gosto de ti (e eu falo esse ‘ti’ não de um modo poético-trovadoresco-forçado, mas de um modo gaúcho fofinho, e meio fora de lugar como todo gaúcho e todo artur sabem ser) ou de uma imagem de ti, uma idéia falsa construída na minha cabeça a partir de uma insuficiente experiência admirativa? E se gostar não de ti propriamente dito mas de um tu falso, talvez seja gostar de qualquer jeito, talvez a distinção não faça diferença até que alguém tenha a ousadia de dizer que “ama” alguenhoutro. Afinal, eu já falei das opacidades, e se tanto opaco tantos somos, fica difícil definir essa dicotomia imagem-realidade, pois a imagem se baseia naquilo que a realidade permite; e não, Marina, eu não quero que as pessoas sejam transparências, porque então também não daria pra ver elas, e nós as perderíamos para sempre na invisibilidade do ar crepuscular, eu queria que as pessoas fossem translúcidas, mantendo seu colorido, suas sombras e clarezas, mas translucidamente (podendo até ter pontos de maior transparência ou maior opacidade, por que não?), o translúcido é o novo preto, o preto translúcido não deixa de ser interessante, o interesse do translúcido é – além da diversão – a visão global que se possibilita. E sim, é possível uma existência menos opaca do que a das pessoas que atualmente nos cercam, mas é tudo tão complicado, tudo tão infinitamente mais complicado do que tinha de ser, tudo tão mais difícil e irresolvível e segredável e impossível... tudo tão grande. Mas na verdade é tudo pequeno! Megalomania travestida de problema real.

Mas eu queria, sem lupa, analisar de perto a sua pele, e ver suas pintas, seus pêlos e poros. E quem sabe te morder...

XIV - Uma pergunta

Eu mudei? Do primeiro semestre pra cá? Porque eu não vejo mudança, mas acho que intuo uma.

Queria perguntar para as pessoas se eu mudei (e se algum espírito generoso ler até aqui essa mensagem infinda e ainda ler esse parênteses e quiser ainda deixar um comentariozinho ali embaixo, poderia talvez me responder com sua opinião), mas não tenho coragem de perguntar.

E se me disserem que sim?
Terei de – realmente – mudar? Terei de aceitar que algo aconteceu nas férias? Terei de pensar se é mais do que eu penso que é? Terei de aceitar? De admitir? Se não o conseguir, terei de buscar uma outra possível causa para a mudança, uma causa que pode me levar a descobrir algo que eu realmente não queria saber e que estava adormecido e que eu despertei apenas porque fui curioso sem dever ser e cedi à tentação e perguntei algo que talvez eu nem devesse perguntar porque uma pergunta é sempre uma possibilidade de resposta e as respostas, Marininha, podem ser uma hora uma coisa e uma hora outra, então podem ser uma hora o que eu quer ouvir (que eu nem sei o que é) e outra hora algo terribilíssimo, e podem ser algo totalmente desvencilhado ao assunto que eu tinha como subtexto da minha pergunta mas totalmente cabível dentro da pergunta, e aí então eu vou ter de aceitar a resposta porque ela é res-posta, re-posta, posta-re, e fui eu que a pedi mesmo pedindo outra coisa, e aí então eu vou ter de me procurar pra ver se essa re-sposta é verdadeira ou não, e quem sabe o que é verdadeiro dentro de si mesmo?, talvez alguém saiba, você sabe?, não, não quero que você diga que os outros não sabe, quero que você me diga se você sabe, e isso não é uma pergunta capciosa ou retórica, não é pra te pegar pra me mostrar inteligente ou sábio pra te fazer pensar, é sim uma pergunta totalmente singela e perguntosa, é uma pergunta que (e, oh meu deus, quem sabia que esse tipo de pergunta ainda pode ser feita na sociedade atual, com seus capitalismos e individualismos e críticas da linguagem e silêncios dos intelectuais e neomarxismos e neoescolásticas e neopaganismos e wicca e arte em quadrados e livros sobre a arte da guerra nos negócios) é uma pergunta que simplesmente quer saber a resposta, mas a minha pergunta (aquela de se eu mudei) não é uma pergunta que simplesmente quer saber a resposta, é uma pergunta que quer saber a pergunta, uma pergunta de se fazer e que quer TALVEZ a resposta CERTA, aquela que a pergunta quer ouvir, mas ela não diz qual pergunta ela quer ouvir então fica impossível do meu dialogante saber e eu corro o risco de ouvir o que eu ou melhor a minha pergunta não quer quero ouvir, corro o risco de não despertar em mim um afeto preexistente mas, quem sabe, que horror, vir a descobrir algo, espero que não, Eus me livrem, mas é possível, quer dizer, o professor Pedro e o Roland Barthes dizem que não é possível, mas se for aí eu me lasquei, e eu não vou querer testar a teoria dos diálogos de Barthes-Pedro-Artur num momento tão delicado como esse, vou?.

XV - Serafim

“(...)é verdade que aquele mudo é um anjo.”

Eu, que nunca acreditei em anjos, sempre vi neles algum significado muito esquisito que eu gostaria de checar. Se eu sou o centauro, nada mais natural que meu você seja um anjo. O homem-cavalo e o homem-pássaro (não no sentido super-heróico, mas no sentido antropozoomórfico de um verdadeiro deus).

A assexualidade dos anjos - gozado discutirmos isso hoje, se era justamente disso que eu queria falar... Assexualidade é sim impossibilidade amorosa. É distância, é limpeza... Mas eu sou tão sujo, porra, tão sujo...

Mas quando eu decidi que este texto falaria de um serafim, sequer sabia o que era exatamente um serafim. Vejamos:

blá blá blá... categoria angelical mais próxima de Deus... blá blá blá blá blá blá blá captação energética elevada blá blá blá individualistas, impulsivos, [quem sabia que os seres divinais podem ter características tão profanas?] detestam a insegurança ou a imprudência dos mais próximos [não parece com você essa segunda parte depois do 'profanas?]'...] blá blá blá sinceros blá passionais ao extremo blá às vezes não conseguem compreender as pessoas [isso tá tão genérico quanto previsão do futuro...] blá blá fazem tudo de modo rápido e independente blá blá blá gostam de queimar energia com esportes ou muito trabalho. Freqüentam qualquer tipo de lugar, são como os camaleões blá blá blá Sentem-se de certa forma responsáveis pelo destino dos amigos e familiares blá blá blá a adolescência é muitas vezes [péra, anjos têm adolescência?!?! Ok, VOCê tem, mas você não é uma anjo LITERALmente] um período difícil blá blá blá blá não gostam de ficar sozinhos, mas precisam do seu espaço blá blá são românticos, ansiosos, possessivos e têm tendência ao casamento.

Ok, deixei de achar confiável essa explicação, nunca ouvi que anjos pudessem se casar...

Voltemos à imagem que é isso que importa: eu terra, você ar. Você vindo do empíreo com seu brilho supralunar para, simplesmente, tomar o foco. Para ser visto por mim. Sem nem saber disso... Que ironia... que provocação! Que beleza... que sublime.

XVI – Desejo ou não de que esta seja uma carta de amor

CARTA. ... Que quer dizer isto, “pensar em alguém”? Quer dizer: esquecê-lo (sem esquecimento, não há vida possível) e despertar muitas vezes desse esquecimento. Muitas coisas, por associação, inserem você em meu discurso. “Pensar em você” não quer dizer nada mais do que esta metonímia. Pois, em si, esse pensamento é vazio: não o penso; simplesmente, faço-o retornar (na medida mesmo em que o esqueço). É a esta forma (a este ritmo) que chamo “pensamento”: nada tenho a dizer a você, senão que este nada é a você que o digo:

“Porquoi j’ai de nouveau recours à l’écriture ?
Il ne faut pas, chérie, poser de question si nette,
Car, en vérité, je n’ai rien à te dire;
Tes chères mains toutefois recevront ce billet.”

(...)

Como desejo, a carta de amor espera resposta ; impõe implicitamente ao outro que responda, sem o que sua imagem se altera, torna-se outra. É o que explica com autoridade o jovem Freud à noiva: “Não quero entretanto que minhas cartas continuem sem resposta, e deixarei imediatamente de escrever-te se não me responderes. Perpétuos monólogos a respeito de um ser amado, que não são nem retificados nem alimentados pelo ser amado, resultam em idéias errôneas quanto às relações mútuas, e nos tornam estranhos um ao outro quando nos reencontramos e achamos as coisas diferentes daquilo que, sem confirmação, imaginávamos.”
(...)

Mas eu já disse: “Um blog não serve pra nada se virar 'diário pessoal' ou se virar modo para falarmos com nossos amigos - esse deve ser o bom e velho diálogo. Um blog, creio, tem uma função muito simbólica. Pode-se escrever e desabafar tudo num pedaço de papel que ninguém vai ler. Mas aí não é DE VERDADE. Aí não é DESABAFO. DE SABAFO, DEVERDADE... Aí é masturbação intelectual...”

Então não posso esperar tua resposta?
Já não podia de qualquer jeito, mas agora nem o sentimento da espera tem legitimidade.

Agora isso já não é uma carta de amor.

Mas eu também não queria que fosse uma carta de amor,
Pois eu não amo.
Sei que não amo.
Posso gostar, sentir, querer, lembrar, chorar, mas não amo.
Então não caberia escrever uma carta de amor, não é mesmo?

De carta de amor, só o ridículo.

17 – Bibliografia

-BANDEIRA, Manuel. “Dedicatória”.

-BARTHES, Roland. Fragmentos de um discurso amoroso.
Trechos: Dedicatória; Ausência; Entender; Incognoscível; Carinho; Por quê; Carta.

- MEIRELES, Cecília. "Motivo".

- SALLES, Marco André Cenamo. “eu te dou certeza de que surtaria”.

- SCHILLER, Friedrich. “Quando a alma fala, já não fala a alma”.

“Eu amo você.”
S.S. V.T.D. O.D.
Sujeito amoroso
Verbo amar
Objeto amado,

“Eu te amo.”
S.S. O.D. V.T.D.
Aproximação
Entre sujeito
E objeto.

Quem tem o direito de dizer qual deles? Talvez o segundo seja para os amores correspondidos. Talvez o primeiro seja para os informais. Talvez Você seja eternamente uma palavra desamorosa.

Talvez isso tudo não importe, e só interesse que

Sujeito é Objeto
e
Objeto é Sujeito.

E a dialética de tudo vai dar um jeito de transformar isso em História.



Mas, enfim, meu problema é mais além: eu acho que você nem vai ler isto.

14 Comentários:

Blogger Ozzer Seimsisk disse...

De alguma forma este texto me surpreendeu. E acho que eu só consegui lê-lo porque o fato de você também achar que amor não é sentimento (tenho pensado nisso esses dias) me chamou a atenção. Então li do começo, e acho que entendi muita coisa. Mas certamente não tudo. Não tudo do que eu queria entender.

Você me perguntou se podemos nos apaixonar por anjos. Acho que na hora eu não entendi a pergunta. A questão toda da assexualidade ser também falta de amor. Mas o que é amor? Anjos não têm sexo porque anjos não têm corpo... Então não, você não pode se apaixonar por um anjo, porque é absurdo.
Mas se um anjo tem corpo, então pode ser amado, mas como ser humano, não como anjo? Talvez porque amor também tem lá seu lado espiritual, essa pergunta a cada vez que a faço tem menos sentido.

Você já parou para pensar que o que você vê como um anjo talvez seja para si um cão ou um homem, ou um demônio disfarçado?

Não posso dizer que você mudou: porque afirmar que mudou é afirmar que um dia foi uma coisa e agora tornou-se outra, e não posso afirmar com certeza que um dia foi alguma coisa, por algum tempo. Diria talvez que você mudou desde que fez essa pergunta -- tudo bobagens. A questão é: você mudou de essência? Você não é o que era? Mas o que é? E o que era? Talvez você pareça diferente, mas tudo o que era continue lá -- talvez algo tenha sido acrescentado. Ou talvez você esteja diferente, mas tenha voltado ao seu estado normal. Nesses casos, posso dizer que mudou?

Me lembro de você diferente. E menos feliz, principalmente. Ou arrumado. Mas como posso afirmar que apenas os momentos de que me lembro representam uma fase, uma coisa passageira? Bom... Naquela época você não diria que não ama apenas como uma correção.

Aliás, é repetitiva a sua pergunta a respeito das certezas. Quem não a faz? Não tenho certeza de nada: tivesse alguma certeza eu a repetiria a toda hora, maravilhada, até que se tornasse um nada ou uma mentira. Como alguém pode saber o que é verdadeiro dentro de si mesmo, onde mal se pode pôr a mão no fogo para ver se queima (porque às vezes queima, mas outras, não)?

Aliás, discordo: o eu-te-amo é o que dizem os apaixonados, buscando aproximar-se do ser amado até a fusão. O eu-amo-você é o que dizem os amantes agradecidos, os fascinados com o recebimento do presente, os que pronunciam o Você mais alto que o Eu e que o Amo.

29/8/05 22:25  
Blogger Artur disse...

vou esperar para ter TEMPO de replicar esse seu comentário, Marininhazinhazinha. Mas está prometido.

30/8/05 19:40  
Blogger Ozzer Seimsisk disse...

Esperarei ansiosamente, Tuts.

31/8/05 20:58  
Blogger miriamics disse...

Tutu,
seus posts são daqueles de imprimir pra depois ler com calma. O problema é que quando vou comentar já mudou tudo...
Bjinhos

1/9/05 12:12  
Blogger Artur disse...

Pois, por favor, comente quando (e como) quiser, as mudanças acontecem de fato, mas isso não invalida o que foi mudado... sei lá, algo do tipo mudou mas continuou, uma mudança-não-mudança (ou não-mudança-não?) etc.

2/9/05 22:06  
Blogger Artur disse...

Respondendo, finalmente, ao comentário da Marina:

Primeiro de tudo, sejamos transparentes pelo menos nisso: o que você queria entender? Qual parte das coisas? Porque, é claro, algumas delas eu posso de ajudar a entender. Outras não. Outras eu não entendo também, ou entendo e não sei, ou entendo e finjo que não.

Anjos não têm sexo porque não têm corpo? Bem, sei lá, no meu caso tem corpo sim. Bem, no fim também tem sexo. Então é, mas simbolicamente não tem. Psiquicamente não tem, a alma é andrógina, todos nós temos nosso Animus e nossa Anima. Mas a assexualidade dos anjos não é a presença de Animus e Anima, não é a plenitude mas a ausência mesma. Então é, não se deve poder apaixonar por um anjo. No entanto, talvez sim: não perguntei sobre amor, mas sobre paixão. Realmente, não se deve poder AMAR um anjo. Mas a paixão é algo unilateral, portanto não sei se deve importar a natureza do objeto de paixão... não concorda?
E sobre o amor ter seu lado espiritual, daí vai depender do que se quer dizer com espírito... pode-se provavelmente dizer que tem seu lado imaterial, mas que está intimamente ligado ao seu lado corporal, então tudo fica complicado e não se sai do ponto de partida, mas o que importa é que há um anjo em meu horizonte, um anjo que me segue como aquelas manchas que ficam na vista depois de a gente olhar pro sol, e a gente pode até esquecer que ela está lá, mas ela continua lá, todas essas manchas vão se acumulando até o momento da nossa morte, que nada mais é do que o apagamento das manchinhas de olhar pra luz.

"Você já parou para pensar que o que você vê como um anjo talvez seja para si um cão ou um homem, ou um demônio disfarçado?"
Todo dia, todo instante, todo tudo. É impossível não pensar, principalmente ouvindo o que se ouve dele (não 'dele' como 'sobre o anjo', mas 'vindo dele'), mas pra mim continua sendo anjo anjo anjo, e pulando dois passos na sua escala descendente há que se lembrar que todo demônio é também um anjo, um anjo caído mas um anjo, e nesse sentido acho que faz TOTAL sentido falar que meu anjo é um demónio, pois queda é a palavra que mais se aplica a essa pessoa. "Cão", talvez, mas cão com um anjo-demónio dentro (ou fora). E homem não tem graça, homem todos somos eu você ele, então a gente tem de criar alguma figura inumana para nos representar. Oras, eu também sou homem, mas sou centauro. Escolhi pro meu anjo a figura do anjo, mas talvez meu anjo tenha pra si uma outra figura inventada, e aí que seja, mas provavelmente eu nunca saberei pois eu sou a única pessoa boba que leva a sério essas histórias de anjos e centauros...

Realmente, essa coisa de mudou é esquisita em seu(s) possível(eis) sentido(s), acho que está mais pra 'acrescentou' mesmo, mas agora eu já percebi que, seja ou não seja (eis a questão?), acrescentou-se SIM algo a MIM, e algo mudou no sentido de que acrescentou, e eu estou tendo respostas reações restímulos diferentes, piores ou melhores ou diferentes ou sei lá.

"Me lembro de você diferente. E menos feliz, principalmente. Ou arrumado. Mas como posso afirmar que apenas os momentos de que me lembro representam uma fase, uma coisa passageira? Bom... Naquela época você não diria que não ama apenas como uma correção."
Gozado, ESSA diferença eu não noto... noto, TALVEZ, uma pequena mudança exterior, aparente, nesse sentido, mas por dentro eu ainda estou na festa da Luda.
E não digo que não amo apenas como correção. Pelo menos acho que não. Sempre entendi que a continuidade desde "aqueles tempos" até hoje era uma obviedade que não precisava ser mencionada. Bem, menciono: continua.

Quanto às certezas: claro que não se pode ter certeza a respeito de nada e muito menos dos sentimentos que a gente guarda dentro no fundo do nós, mas alguma certeza maior do que outras HÁ, há o "eu te amo" o "eu te gosto" o "eu acho que eu te amo" e o "eu não faço idéia, eu não sei nada, e mesmo assim eu faço um post gigantesco com partes e partes e partes e um monte de citações pentelhas só para falar desse nada que sei". Mas agora acho que acho que acho que gosto (sem me separar do "eu não faço idéia).

"Aliás, discordo: o eu-te-amo é o que dizem os apaixonados, buscando aproximar-se do ser amado até a fusão. O eu-amo-você é o que dizem os amantes agradecidos, os fascinados com o recebimento do presente, os que pronunciam o Você mais alto que o Eu e que o Amo."
Não sei com que você discorda: eu nunca afirmei nada, só disse talvezes. Porque acho mesmo que saber sobre os euteamos e os euamovocês é só pras pessoas que já falaram isso, é só pras pessoas que têm direito de falar isso. O que eu faço é tentar adivinhar o recheio do sanduíche analisando quem o come...

2/9/05 22:44  
Blogger Artur disse...

Desculpem-me comentar tantas vezes seguidas, mas preciso falar algumas poucas coisas.

1) Só pra quem não entendeu: eu ODEIO gostar de alguém.

2) -"Cê tá fudido.", ela me disse, quando soube quem era minha criança-gente-oAnjo.

3) Gosto de alguém. Os sintomas estão todos aí, como os reconhecera da última vez, como aparecem nos livros, nos filmes. E, acima de tudo, senti.

4), senti, na segunda feira, num impacto de F=1ânjion, por um deltaT de 0,001s, o que implica num impulso bastante grande que quase me fez cair, mas se eu caísse vocês iam ver e ia ser esquisito.

5) aí, sim, "Cê tá fudido.", ela disse.

6) E eu concordei, veementemente.

7) "Quien con veros pena y muere, que hará cuando no os vere?" Esperar, sonhar... pois, infelizmente, INAGÜENTÁVEL é uma palavra que eu já desinventei.

2/9/05 22:50  
Blogger Ozzer Seimsisk disse...

Primeiro de tudo: o que diabos essa frase significa?

O resto eu talvez responda depois.

7/9/05 00:01  
Blogger Artur disse...

qual frase?

7/9/05 21:22  
Blogger Marco disse...

Lendo pedacinho por pedacinho, o pato enche o papo. Algum dia eu acabo.

8/9/05 11:29  
Anonymous Anônimo disse...

Nunca eu consegui falar com clareza (clara- clareza eis ai uma pequena ironia XD) daquilo que eu não sei.
Amo como todos amam e sempre amarão. Não existe o não amar assim como não existe o não existe.
Se vc mudou eu diria que sim... Não sei em aspectos complexos e nem filosoficamente mas o que vc pensa já não é o mesmo. Assim como provavelmente não será no momento em que vc ler esse comentário.
Eu também não entendi algumas das coisas que vc disse mas também não sei se quero entender.
Quanto ao exterior, eu simplismente não acho que vc mudou... Para mim vc sempre foi um poço de mistério. Voçê pode ser sempre sincero e aberto em relação ao que vc pensa mas eu nunca consegui captar um sentimento em vc que não fosse extremo. Ou uma grande raiva ou grande alegria. Ou até quem sabe uma profunda tristeza. Mesmo que vc mudasse esternamente eu acho que não iria perceber....
Mas depois de ler tudo isso que vc escreveu eu n tenho a mínima vontade de falar de amor... Mas eu queria sim é saber pq é q vc odeia. Ou diz que odeia.
sei lá... boa noite...

15/9/05 23:08  
Blogger Artur disse...

Só a Clarinha pra escrever "você" com "ç"!

Como não odiar?

16/9/05 18:31  
Anonymous Anônimo disse...

Eiiii
eu tava com sono... XDDD
vc eh mau... tbm n comento mais =p

16/9/05 22:09  
Blogger Artur disse...

O que fazer quando se descobre que a pessoa por quem se está apaixonado (e sim, no exato momento em que se descobre que se está apaixonado por esta pessoa, e não apenas 'gostando' dela) nunca corresponderá ao seu sentimento? O que fazer quando o único meio de ser feliz morre? Como seguir em frente? Como eu posso ter vontade de ir pra Campinas fazer o que quer que seja se eu vou deixar aqui a pessoa em quem eu penso durante o dia todo? Como não se jogar da varanda do apartamento de um amigo meu depois de ficar sabendo que eu vou continuar em paixão, e que esse problema nunca será solucionado? Posso aceitar a idéia de 'um dia irei esquecer', se a última coisa que eu quero é esquecer? Se eu prefiro continuar infeliz a deixar esse sentimento acabar (e se ser continuar infeliz é a única alternativa nesse jogo de falsa liberdade), como não dar um tiro na própria cabeça? O que eu posso fazer, porra?

24/9/05 13:54  

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