7.4.06

Sobre a felicidade

No fim, nem é tão surpreendente assim, certamente eu já esperava isso há muito tempo, apesar de sempre empurrar para longe a idéia; no fim, nem é tão terrível assim, e ao mesmo tempo é. Mas faz todo o sentido do mundo.

Um santo mudaria seus atos se soubesse que não há paraíso?
Um comunista pisaria no proletariado se soubesse que não há utopia?
Um asceta se entregaria ao samsara se soubesse que não há nirvana?
Um artista desistiria de seu ofício se soubesse que não há beleza?

Eis a verdade: não existe felicidade.

Então vamos investigar: o que seria a felicidade?

Felicidade tem a ver, sem dúvida, com satisfação. Estar satisfeito, contente com a própria vida. Com o que da própria vida? Será a felicidade o que se sente/experimenta quando tudo está bem? Ora, seria então fácil demais provar sua inexistência, visto que jamais tudo estará bem. Ou quando tudo aquilo que importa está bem? Mas não nos importa a situação do mundo, a fome na África, a saúde de nossa mãe, a felicidade de nosso amigo depressivo? Isso não deve ser empecilho para nossa felicidade, ou seria difícil demais ser feliz.
Felicidade deve ser, então, algo meio egocêntrico: é, na verdade, quando eu estou bem. É a velha história do copo... Nunca estará cheio, mas enquanto estiver sendo preenchido estaremos felizes.

Mas o que preenche o copo?


O copo é preenchido pela realização de nossas exigências próprias, em termos de profissão, conhecimento, prazer, conforto etc. Mas o copo também tem, é claro (afinal, todos nós já vimos alguma vez na vida um copo), um fundo. Esse fundo é composto por certas coisas que não escolhemos exigir, mas sem as quais não podemos viver: seria a coisa mais próxima de nossa natureza, essência, nossa condição humana. Aí cada um entende como quiser quais são essas exigências inatas.

O que o Artur entende por exigências inatas?

Comer. Dormir. Certo nível de saúde. Descanso. Demais necessidades físicas. Amar.

Aí surge o obstáculo. Tudo isso, no fundo, se são necessidades que não escolhemos ter, não depende do Acaso? Então a felicidade vem e vai com o acaso... não tem constância ou sustância, e é perdida na menor distração.

Pode a felicidade ser função do acaso, simplesmente?

Não.
Ou seria apenas uma sensação momentânea (“Poxa, estou me sentindo feliz nesse segundo!...”). Mas para isso temos outras palavras – a.le.gre, con.ten.te, bem-hu.mo.ra.do etc.
A felicidade seria um estado de existência. Afinal, os filósofos, quando buscam a felicidade, não buscam bons momentos (prazer), mas sim algo durável, estável, garantível (pois esses filósofos não tentam encontrar uma fórmula para ser feliz?).

Se a felicidade não pode ser função do acaso e é, como fica a questão?

Como eu comecei: não existe felicidade.

E como fica o homem?

Essa é a questão.
O homem está, a todo momento, à procura da felicidade. Tudo o que escolhe fazer tem um objetivo. Todo objetivo encaixa-se num objetivo maior. E o objetivo final é sempre a felicidade. Assim o masoquista, o hedonista, o asceta, o religioso, o estudioso, o vagabundo, o trabalhador... o suicida – sim, também o suicida, que busca no momento de sua morte uma rápida mas absoluta felicidade (eu bem sei). Assim aquele que tenta provar que a felicidade não existe.

Ou seja, por mais que eu não acredite mais em felicidade, algo em mim continua crendo, e continua buscando-a.

Então eu devo me entregar a uma mentira?

Sim e não.
Devo ter a consciência de que não vou conseguir escapar da impossível busca. Mas devo também constantemente me relembrar da inexistência da felicidade, me treinar para não me deixar mergulhar completamente: respirar pela boca um ar diferente daquele que eu respiro pelo nariz. Separar os ares e não deixar que eles se misturem – pois o ar da verdade se perderá nessa solução.

Mas o que eu posso fazer?

Nada.
Não seremos felizes jamais (e mesmo quem diz já ter sido feliz só está caindo num erro de comunicação). Se todos os nossos atos são no sentido de alcançar a felicidade, todos os nossos atos são inúteis. Não adianta berrar, gritar, matar, morrer. Não há fuga, não há saída. Somos livres, absolutamente livres, mas isso não faz diferença. Estamos presos num mundo sem felicidade. Mais ainda, estamos presos numa mente que não aceita isso. Provavelmente, o melhor que se tem a fazer é viver o mais confortável e prazerosamente possível (que não se confunda isso com um hedonismo, pois não há a fé na felicidade por meio do prazer). Façamos o que nos dá pequenos momentos de alegria, pois estes são o máximo que podemos garantir pra nós mesmos. Talvez um dia vivamos um contentamento, uma satisfação maior – quem sabe encontremos o Amor, ou a Fortuna, o Êxito, ou até mesmo Deus. Então poderemos pensar que somos felizes.

Mas não se engane, meu querido, é tudo acaso. E vai embora.

6 Comentários:

Blogger yuribt disse...

E o Acaso é um deus velho, enrugado, caidão e possivelmente careca; está nem aí pra Homem ou pra Felicidade, Fortuna ou Amor. Tá nem aí.

7/4/06 20:04  
Blogger Artur disse...

nah, até que seria bom se a gente pudesse concretizar o acaso numa imagem...

7/4/06 20:11  
Blogger Ozzer Seimsisk disse...

...e obviamente nada do que seria bom existe.

Você não me convenceu muito.
Acho mesmo idiota pensar em felicidade assim. Se pra viver a gente precisa de comida com certa constância, se pode sentir fome, se pode -- então pra ser feliz é preciso antes de tudo uma grande capacidade de sofrimento. Acho que a felicidade é tão real quanto aquela sensação gostosa de barriga-cheia, de matar a sede. Mas não mais.

7/4/06 23:00  
Anonymous Anônimo disse...

Eu tbm n concordo n o.O...
Acho que existe felicidade sim e que vc pode ser feliz mesmo n tendo o que comer ou as condições mínimas nessessárias....
Eu acredito que eu sou feliz e que agente pode ser feliz quando tem um propósito. Um objetivo... Eu não acho q vc vai me entender ou provavelmente isso não vai funcionar pra vc... Pra mim quando agente tem um objetivo na vida agente ta sempre utilizando ela para algum propósito e isso te faz feliz.... Quanto maior o objetivo e menos egoista isso te faz mais feliz... Por exemplo: Quando vc deixa um amigo feliz isso não te deixa feliz? Agora imagina vc dedicar a sua vida a um objetivo grande (não um simples como ser rico ou ser o melhor no seu emprego. Coisas grandes como mostrar para os seus amigos que a vida valhe a pena e ser o exemplo vivo disso! Acho que o processo só traz felicidade e o resto, as coisas ruins e pequenas que acontecem não são nada perto do seu objetivo e não abalam mais a sua felicidade...
Acho que é mais ou menos isso.... Bem... tentei explicar o q eu sinto... só...

9/4/06 15:22  
Blogger Charles Bosworth disse...

Bah.. Isso não é felicidade! Se a gente depender do acaso vai ficar esperando pra sempre. E o copo pode ser de vidro, requeijão ou de plástico. Se você nunca se arriscar a perder algo o copo vaza.
Felicidade é uma colina. He he..

P.S. - Eu entendi Clara, mas acho que por isso você esperava.

9/4/06 19:50  
Anonymous Anônimo disse...

eh chan ^^
achu q sim =D

10/4/06 00:53  

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